domingo, 20 de abril de 2025

Figueira, 1957

Na Figueira daquele tempo as senhoras de idade encurralavam uma criança no passeio só para a arranhar com os bigodes
Quando eu as via já era demasiado tarde. A minha avó em vez de me defender empurrava-me para a frente: "Dá um beijinho à D. Fulana, vá...".   
Assim que virávamos costas, resumia-me as histórias delas.
 
"As Ornelas foram ricas,
as Barrosão ainda o são,
a mais baixinha ensina
a doutrina às crianças.
Nenhuma das três Parrancas
casou. Mas muito pior ficou
a Berta Araújo cujo
marido fugiu com outra. 
Sabe-se lá se ela passa necessidades..."
 
Afrouxávamos o passo junto ao casarão descambado onde ela morava. Tinha janelas de guilhotina que me tiravam a vontade de falar. Quem ali vivia, precisava de ter muito cuidadinho com a cabeça. 

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